segunda-feira, 24 de março de 2008

Podemos confiar nos Analistas de Ações?

Por: Fernando Caio Galdi

Uma pergunta que todo investidor deveria fazer é: o quanto posso confiar nas opiniões que os analistas de ações divulgam em seus relatórios? Para ajudar a respondê-la, vou explorar três pontos fundamentais. Primeiro qual o modus operandi da profissão, depois quais são os incentivos que podem influenciar algumas opiniões dos analistas e finalmente relatar fatos históricos e evoluções recentes envolvendo a profissão de analista de valores mobiliários. Afinal é olhando para o passado que se pode projetar o futuro.

Para o bom funcionamento do mercado de capitais, em especial do mercado de ações, são necessárias informações corporativas precisas para que os investidores possam atribuir preços adequados para os títulos que negociam. Costuma-se dizer que o fluxo de informações é o fluido que faz a "máquina" do mercado funcionar sem maiores desgastes.

Nesse contexto atuam os analistas de ações, chamados também de analistas de equity. Esses analistas têm a função de diminuir a assimetria de informações entre a empresa e os investidores. Eles coletam informações, analisam os dados e realizam projeções do desempenho e do resultado das empresas.

Utilizando uma metodologia de avaliação (valuation), esses profissionais elaboram relatórios com recomendações que podem influenciar o comportamento dos investidores que têm acesso a esse tipo de informação. Vale lembrar que os analistas de ações podem ser classificados como: analistas de buy-side e analistas de sell-side. Os primeiros são aqueles que trabalham internamente nos fundos mútuos, fundos de pensão, hedge funds ou outras instituições, mas que não emitem relatórios com recomendações de compra ou venda de ações junto ao público em geral. Os últimos são analistas que divulgam seus relatórios para diversos clientes, normalmente da corretora ou banco de investimento para o qual trabalham. Estes são regulados e fiscalizados, no caso brasileiro, pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Vamos nos concentrar, daqui em diante, na atuação dos analistas de sell-side.

Como em qualquer outra profissão, os analistas têm interesses próprios. Também, como em qualquer outra atividade profissional, existem os bons e maus profissionais. O melhor analista é aquele que mais acerta suas projeções a respeito do comportamento das ações e aquele que mais adequadamente consegue explicar a performance da empresa.

Contudo, outros interesses podem permear alguns relatórios de analistas mal intencionados. Como exemplo, vale citar que no auge da crise do mercado acionário norte-americano em 2001/2002 alguns analistas, como Jack Grubman e Henry Blodgert, ficaram famosos por serem acusados de emitir relatórios que ofereciam aos clientes análises repletas de atrativos, mas que davam poucas informações a respeito do valor das empresas. Os incentivos que guiavam esses analistas estavam vinculados aos bônus que recebiam e tinham pouca relação com o verdadeiro interesse dos seus clientes. O ideal para os maus analistas era maximizar seu bônus, nem que para isso fosse necessário negligenciar algumas informações.

O Nobel de economia Joseph Stiglitz, em seu excelente livro "Os exuberantes anos 90" comenta que: "Em vez de advertir sobre empresas que falsificavam a contabilidade ou enterravam números reveladores sobre camadas obscuras, os bancos ajudavam a trapacear. Alguns analistas de Wall Street não entendiam bem as empresas que estavam promovendo; outros, como sabemos por seus emails depreciativos, entendiam bem demais".

Esses acontecimentos foram importantes para impulsionar uma regulamentação mais severa da profissão e ajudar a proteger a imagem dos bons analistas. No Brasil, por exemplo, a CVM emitiu em abril de 2003, a instrução no 388 que regulamenta a atividade de analista de valores mobiliários e estabelece condições para seu exercício.

Entre as principais medidas adotadas está a necessidade do analista declarar, em cada relatório que emite, se sua remuneração está, de alguma forma, atrelada às suas opiniões emitidas. Outra importante alteração foi a necessidade de certificação profissional para o analista poder exercer sua atividade.

Em resumo pode-se dizer que os analistas de ações no Brasil possuem hoje uma supervisão mais intensa por parte da CVM e uma responsabilidade maior perante o mercado. Parte disso deve-se a evolução do mercado de capitais brasileiro e a recente onda de IPOs e de novos investidores aderindo às aplicações em Bolsa. Nesse sentido é importante que ao receber o relatório de um analista, o leitor tenha em mente que na maioria das vezes o analista está trabalhando de acordo com o interesse dos clientes, mas algumas vezes pode haver outros interesses guiando suas opiniões.

Assim, mesmo tendo acesso ao relatório de analistas, é importante que o investidor tenha entendimento da linguagem e de alguns conceitos utilizados, de maneira a poder julgar mais adequadamente as ações em que pensa investir.

Doutorando em Ciências Contábeis pela FEA-USP, Fernando Caio Galdi é professor da FUCAPE Business School e escreve mensalmente na InfoMoney, às quintas-feiras.
fernando.galdi@infomoney.com.br