quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Crédito, crédito e crédito: os três segredos do governo para enfrentar a crise

G1 - Thais Herédia

O governo não cansa de repetir que a caixa de ferramentas para enfrentar os efeitos da crise externa tem muitas opções.  Uma delas deverá ser a mais utilizada: o crédito. O crédito depende de uma noção fundamental em economia, a confiança. Há ainda uma outra variável que influencia o movimento das operações que é a intensidade do estímulo ao consumo, ao investimento.

"Começamos a ter uma piora na confiança do empresário brasileiro. Os índices que revelam a confiança podem romper a barreira do conforto. Esse processo ainda está em curso, o risco é mais de surpreender para pior do que para melhor", avalia a economista Zeina Latif.

O estímulo, na outra ponta da formação do crédito, deverá ser o peso para o equílibrio desta balança. Em reunião com empresários em São Paulo, na semana passada, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, teria deixado claro que o governo não quer deixar a economia crescer abaixo dos 3% este ano e em 2012. E o esforço para manter esse patamar será feito pelo crédito.

"Luciano Coutinho parecia menos pessimista do que temos visto no mercado. Ele repetiu que o governo tem instrumentos para superar a crise e surpreendeu ao indicar que um deles deverá ser um aumento das concessões do BNDES. Nada dramático como vimos em 2009. Segundo ele nos disse, o ritmo de empréstimos do banco, que hoje está na casa dos R$10 bilhões a R$ 12 bilhões por mês, deve subir para perto de R$15 bilhões. Coutinho deixou claro que não há uma meta do BNDES ou do governo para este ano ou para 2012, mas disse que o objetivo agora é fechar 2011 com volume de até R$ 140 bilhões em empréstimos, podendo chegar a R$ 150 bilhões em 2012″, disse ao G1 um dos empresários presentes à reunião.

A assessoria de imprensa do BNDES informou que o banco não comenta o que foi falado em reuniões de trabalho. De acordo com divulgação do banco este mês, os desembolsos de janeiro a setembro de 2011 atingiram cerca de R$ 115 bilhões, 25% a menos do que o registrado no mesmo período de 2010. A queda foi justificada pela "política do banco em reduzir os desembolsos"e por uma cautela maior em função do agravamento da crise na Europa.

"Meu sentimento foi de que as ações estão muito coordenados em Brasília. O esforço do governo de tentar estimular a economia ainda este ano me parece bem alinhado. Daí a urgência do BC em cortar os juros, o aumento do limite de endividamento dos estados, o recuo nas medidas que apertaram o crédito desde o ano passado (medidas macroprudenciais). Coutinho nos disse ainda que o natal será importante nesse processo para evitar que a indústria comece o ano com estoques muito altos", revelou o empresário paulistano,  que saiu do encontro menos pessimista e revisando suas expectativas para o volume de crédito na economia para o curto prazo.

As opções de incentivos ao crédito ainda podem (e devem) ser adotadas muito em breve. O mercado aponta duas delas que já estariam prontas no forno. Uma redução do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) do crédito para pessoas físicas e para os empréstimos externos de prazos mais curtos. A segunda opção é mexer nos compulsórios, um baú de R$ 440 bilhões de reais dos bancos depositados no BC. A própria presidente Dilma Rousseff já deu a dica de que o dinheiro está lá para ser utilizado se a crise apertar.

"A eficácia de um recuo nas medidas macrorpudenciais  tende a ser limitada, mesmo que  o governo desafaça tudo que fez desde 2010. A resposta tende a ser mais limitada porque temos uma inadimplência crescendo. Isto significa bancos e consumidores mais conservadores. Nesse sentido, o ideal é que o instrumento monetário seja usado nessa hora, com gradualismo, como tem sinalizado o BC. É importante trazer a inflação para meta no ano que vem e temos que guardar munição para o pior", ressalva Zeina Latif.

Para a economista, um aumento, mesmo que em menor escala, dos empréstimos subsidiados do BNDES deve ser monitorado de perto, porque o governo brasileiro sofre hoje dos mesmos limites que os países mais ricos. O governo tem uma meta de superávit primário (poupança para pagamento dos juros da dívida pública) de 3,1% do PIB em 2012. E com cenário de menos crescimento já esperado para o ano que vem, a margem para gastos extras está bem apertada, já que a arrecadação cai quando a economia não cresce.

"Eu entendo a ansiedade em querer garantir patamar de crescimento elevado. Mas temos que ser menos ambiciosos hoje para colher os frutos lá na frente. Assim como muitos países lá fora, nós também não temos espaço para política fiscal ou para-fiscal (aumento dos gastos públicos ou empréstimos do BNDES). Ainda que a restrição aqui seja bem menor, o sentido é o mesmo", avalia Latif.

Zeina Latif interpreta os sinais dados pelo governo até agora, como sinais de mais pragmatismo e menos exageros. "O desafio de curto prazo  é deixar claro que a economia será bem conduzida, que o relaxamento nas restrições será de forma responsável. Acho mais razoável aceitar a condição de agora, que é mundial, sem tentar produzir um crescimento artificial. Nós temos colchões para aceitar sacrifícios", diz.