sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Batalha pelo coração da Índia

Por Marcos Troyjo


As potências do G2 (EUA e China) do mundo contemporâneo travam intensa competição em diversos tabuleiros. Projetos estratégicos de Washington e Pequim se abalroam na busca de ascendência sobre a América Latina, alianças na África, predominância econômica e militar na região do Pacífico.

Alvo privilegiado dessa disputa é a Índia. De forma desinibida, cada polo do G2 opera de modo a atrair Nova Déli à sua esfera de relações preferenciais.

Os EUA acenam com parcerias tecnológicas, multiplicação do comércio bilateral dos atuais US$ 100 bilhões para US$ 500 bilhões em dez anos e um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.

A China sinaliza forte adesão de suas empresas ao programa "Make in India", lançado pelo primeiro-ministro Narendra Modi para atração de capitais industriais. Aquiesceu ao desejo de Déli em ocupar a primeira presidência executiva do Banco dos Brics. Sugere aos indianos que eles serão os maiores beneficiários do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB, na sigla em inglês) ao estabelecer-se com fundos majoritariamente chineses.

Tal disputa deixou de ser silenciosa. A visita que o presidente norte-americano, Barack Obama, fez a Déli nesta semana causou grande dor de cotovelo na diplomacia chinesa.

Pequim classificou a nova lua de mel entre Obama e Modi de "reaproximação superficial". Para os chineses, diferenças em energia nuclear, comércio agrícola ou mudanças climáticas restringem a cooperação entre as duas maiores democracias do planeta.

Muitas credenciais alimentam a sedução da Índia sobre o G2. Capacidade de dissuasão nuclear. Única economia dos Brics que não está desacelerando e, segundo o FMI, já em 2016 pode superar a China em percentual de crescimento. Fascinação pelo "soft power" cinematográfico de Bollywood. Joint ventures com gigantes como Tata e Infosys.

Há também toda uma infraestrutura a construir. E toda uma população –que em uma década será a maior do mundo– a alimentar.

Para Washington, a Índia oferece indispensável contraponto à projeção geopolítica de uma China cada vez mais forte militarmente. É aliado importante ante dúvidas que o Paquistão suscita como sócio no combate ao terrorismo.

Para Pequim, a Índia compõe gigantesca oportunidade para as empresas de construção civil chinesas que desejam alternativas à África em operações internacionais. Sua mão de obra barata é imenso atrativo para produção de menor valor agregado. É preciso "terceirizar" setores industriais para equilibrar custos de trabalho cada vez mais altos em território chinês.

Futurólogos da economia global gostam de apontar que o único país com potencial de tornar-se a "nova China" nos próximos anos é a Índia. Tal chance de a história se repetir é pequena, mas existe.

A Índia de Modi tem se movimentado com inteligência na dança com os países do G2.

Ao extrair todo benefício possível do jogo de ambições entre EUA e China, dá ao mundo emergente bela lição do que hoje deve significar o "não-alinhamento".