terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Não bastasse a recessão nos EUA, mercado agora avalia risco de estagflação

Como se a hipótese de recessão nos EUA não fosse suficientemente preocupante, alguns economistas agora levantam a possibilidade de estagflação. A pior combinação possível, entre PIB real (Produto Interno Bruto) estagnado e inflação elevada.

Somados às expectativas ruins para o nível de atividade norte-americano, três fatores parecem embasar os alertas mais pessimistas:

* O petróleo
O preço do barril de petróleo superou a marca de US$ 100, reacendendo temores de que um choque de oferta possa ser transmitido ao longo da cadeia de consumo norte-americana, tal qual nos anos 1970.

* Preços ao consumidor
O CPI (Consumer Price Index) mostrou inflação de 4,3% no acumulado de 12 meses. Mesmo o núcleo do indicador, que desconsidera a volatilidade de alimentos e energia, veio acima do esperado na medição de janeiro.

* O próprio Fed
O Banco Central dos EUA elevou suas projeções para a inflação em 2008, espalhando temores de que o descontrole dos preços reduzirá os graus de liberdade necessários à flexibilização monetária.

Um termo muito forte
Os aparentes sinais de estagflação atribuem grande responsabilidade aos índices de preço previstos para esta semana. Investidores acompanharão de perto o PPI (Producer Price Index) e o núcleo do PCE (Personal Consumption Expenditures).

No entanto, independente do comportamento desses índices, a maior parte do mercado julga precipitada a idéia de uma combinação entre recessão e inflação neste momento. "Sou muito cético quanto a essa classificação", afirma Cristiano Souza, economista do banco Real ABN Amro.

Cristiano acha que o conceito "servia para descrever contextos econômicos que não existem mais". Décadas atrás, as economias não apresentavam o dinamismo atual, os preços eram muito mais rígidos e a dependência do petróleo era marcante.

"Para agora, é um termo muito forte. A economia norte-americana hoje não é tão dependente do petróleo, e a absorção de custos como um todo também é menor".

Além disso, destaca o economista, as expectativas de inflação ainda estão relativamente estáveis: "não teremos uma inflação anual de dois dígitos, mas sim de 2,5%, 3,0% ou 4,0% no máximo". Não é bom, ressalva, "mas também não está fora de controle".

Repercussões negativas
Enquanto problema grave e geral, "essa idéia de estagflação não está fazendo muito sentido", avalia Patrícia Branco. A gestora da Global Equity sugere evitar preocupações exageradas. Já bastaria a previsão de "recessão branda".

Patrícia não ignora, porém, eventuais repercussões negativas a partir do repique nos preços. Mesmo que leves, as pressões inflacionárias podem ser encaradas como grande limitador em um cenário dependente de cortes na Fed Funds Rate. "Todos nós sabemos que o juro só cai se a inflação permanecer baixa".

Já aconteceu
Tradicionalmente, a Macroeconomia descartava a tese de estagflação, argumentando que os mesmos fatores em prol de uma recessão eram contra padrões inflacionários.

A essa tradição, a década de 1970 representou uma assertiva empírica difícil de ser questionada. A combinação entre petróleo mais caro e afrouxamento monetário despertou uma espiral salários-preços, caracterizando o cenário de estagflação.