Por: Rodolfo Cirne Amstalden
Será que o tradicionalmente usado conceito de PIB (Produto Interno Bruto) é o mais adequado para refletir o desenvolvimento econômico? Cada vez menos timidamente, parece avançar a discussão sobre medidas adequadas à avaliação do bem-estar. Se o PIB não se presta à tarefa, precisamos de alternativas.
Um pequeno país asiático como o Butão já propôs a FIB (Felicidade Interna Bruta). O presidente francês, Nicolas Sarkozy, pediu novas ferramentas aos ganhadores do Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen e Joseph Stiglitz. E, no Brasil, Lula discursou, no lançamento do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que "mais desenvolvimento não é somente o crescimento do PIB".
Definições entre parênteses mostram ideias que não se dão de pronto, e podem carecer de explicação além. Em entrevista à InfoMoney, Daniel Kahneman discute vínculos e divergências entre PIB e bem-estar, vê formar-se um consenso, mas pede paciência: algumas questões ainda são prematuras.
Lembrando que a economia não se fecha em si, Kahneman, professor de psicologia da Universidade de Princeton (Estado de Nova Jersey) e importante teórico de finanças comportamentais, dividiu com seu parceiro de pesquisas Vernon Smith (Universidade George Manson) o Prêmio Nobel de Economia de 2002.
InfoMoney - O que aprendemos a partir das principais evidências sobre a relação entre PIB e bem-estar?
Daniel Kahneman - Tomando como base comparações de avaliação global (global evaluation), existe uma ligação bastante próxima entre o nível de produto e a satisfação com a qualidade de vida. As pessoas certamente possuem um padrão para o que julgam ser uma boa vida, e esse padrão carrega características universais. Nesse sentido, diversos estudos de caso apontam que, quando o PIB cresce, a satisfação geral também aumenta, excetuados outros fatores.
No entanto, aqui vale uma ressalva para evitar confusões com os erros de avaliação global*. O impacto do nível de produto é bem menor quando medimos o humor, ou a sensação de felicidade em tempo real (experienced happiness). Esse humor depende muito mais de variáveis como a corrupção ou o nível de confiança no governo do que diretamente do PIB.
Já possuímos um consenso que permita aplicar medidas de felicidade em termos amplos?
Acho que, em muitos países, está sendo construído um consenso importante para a coleta de dados que levem em conta parâmetros subjetivos. Na Europa e no Canadá, por exemplo, esse avanço ocorre rapidamente.
Não devemos cultivar a ilusão de que as medidas de bem-estar substituirão definitivamente os indicadores econômicos tradicionais. Porém, ao menos há um esforço cada vez maior para que tais medidas façam parte das estatísticas nacionais.
Existem barreiras significativas na passagem entre amostras de utilidade individual para uma visão da utilidade social?
Não creio. Acho que, por princípio, a utilidade social deve ser realmente moldada a partir das medidas de utilidade individual. A vida das pessoas depende muito do aparato social, das comunidades em que elas estão inseridas. Então, não acho que essa distinção entre o particular e o todo seja necessária.
As medidas de bem-estar prometem exercer grande força como instrumento político?
Acho que essa questão pode ser relevante no futuro, mas, por enquanto, ainda é prematura. Viveremos muitos anos até que as medidas de bem-estar sejam tão aceitas e respeitadas a ponto de funcionarem como argumento sério dentro de um debate político. Estamos distantes desse macrocenário.
Por ora, considero que as novas medidas devem servir em um âmbito micro, para identificar segmentos da população que enfrentam condições humanas miseráveis e melhorar sua situação. Não acho que teremos grandes discussões políticas sobre a urgência desse segundo caminho.
Avaliações globais de bem-estar estão sujeitas ao que os psicólogos chamam de "ilusão de foco". Como as pessoas têm dificuldade de expressar uma noção geral de felicidade, acabam por exagerar a importância de elementos específicos suscitados. Mais detalhes no artigo "Would You Be Happier If You Were Richer? A Focusing Illusion".
Será que o tradicionalmente usado conceito de PIB (Produto Interno Bruto) é o mais adequado para refletir o desenvolvimento econômico? Cada vez menos timidamente, parece avançar a discussão sobre medidas adequadas à avaliação do bem-estar. Se o PIB não se presta à tarefa, precisamos de alternativas.
Um pequeno país asiático como o Butão já propôs a FIB (Felicidade Interna Bruta). O presidente francês, Nicolas Sarkozy, pediu novas ferramentas aos ganhadores do Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen e Joseph Stiglitz. E, no Brasil, Lula discursou, no lançamento do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que "mais desenvolvimento não é somente o crescimento do PIB".
Definições entre parênteses mostram ideias que não se dão de pronto, e podem carecer de explicação além. Em entrevista à InfoMoney, Daniel Kahneman discute vínculos e divergências entre PIB e bem-estar, vê formar-se um consenso, mas pede paciência: algumas questões ainda são prematuras.
Lembrando que a economia não se fecha em si, Kahneman, professor de psicologia da Universidade de Princeton (Estado de Nova Jersey) e importante teórico de finanças comportamentais, dividiu com seu parceiro de pesquisas Vernon Smith (Universidade George Manson) o Prêmio Nobel de Economia de 2002.
InfoMoney - O que aprendemos a partir das principais evidências sobre a relação entre PIB e bem-estar?
Daniel Kahneman - Tomando como base comparações de avaliação global (global evaluation), existe uma ligação bastante próxima entre o nível de produto e a satisfação com a qualidade de vida. As pessoas certamente possuem um padrão para o que julgam ser uma boa vida, e esse padrão carrega características universais. Nesse sentido, diversos estudos de caso apontam que, quando o PIB cresce, a satisfação geral também aumenta, excetuados outros fatores.
No entanto, aqui vale uma ressalva para evitar confusões com os erros de avaliação global*. O impacto do nível de produto é bem menor quando medimos o humor, ou a sensação de felicidade em tempo real (experienced happiness). Esse humor depende muito mais de variáveis como a corrupção ou o nível de confiança no governo do que diretamente do PIB.
Já possuímos um consenso que permita aplicar medidas de felicidade em termos amplos?
Acho que, em muitos países, está sendo construído um consenso importante para a coleta de dados que levem em conta parâmetros subjetivos. Na Europa e no Canadá, por exemplo, esse avanço ocorre rapidamente.Não devemos cultivar a ilusão de que as medidas de bem-estar substituirão definitivamente os indicadores econômicos tradicionais. Porém, ao menos há um esforço cada vez maior para que tais medidas façam parte das estatísticas nacionais.
Existem barreiras significativas na passagem entre amostras de utilidade individual para uma visão da utilidade social?
Não creio. Acho que, por princípio, a utilidade social deve ser realmente moldada a partir das medidas de utilidade individual. A vida das pessoas depende muito do aparato social, das comunidades em que elas estão inseridas. Então, não acho que essa distinção entre o particular e o todo seja necessária.
As medidas de bem-estar prometem exercer grande força como instrumento político?
Acho que essa questão pode ser relevante no futuro, mas, por enquanto, ainda é prematura. Viveremos muitos anos até que as medidas de bem-estar sejam tão aceitas e respeitadas a ponto de funcionarem como argumento sério dentro de um debate político. Estamos distantes desse macrocenário.
Por ora, considero que as novas medidas devem servir em um âmbito micro, para identificar segmentos da população que enfrentam condições humanas miseráveis e melhorar sua situação. Não acho que teremos grandes discussões políticas sobre a urgência desse segundo caminho.
Avaliações globais de bem-estar estão sujeitas ao que os psicólogos chamam de "ilusão de foco". Como as pessoas têm dificuldade de expressar uma noção geral de felicidade, acabam por exagerar a importância de elementos específicos suscitados. Mais detalhes no artigo "Would You Be Happier If You Were Richer? A Focusing Illusion".