sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O que acontece quando BC compra US$

Autor: Ricardo Gallo
Assunto: O que acontece quando BC compra US$?

Todos sabem que BC intervém no mercado de câmbio, comprando US$ dos bancos. Porém poucos sabem como isto funciona.

O BC, através de sua mesa de câmbio, avisa as mesas dos BANCOS  dealers que irá comprar US$ a vista no mercado. Os bancos entram com suas propostas de venda num sistema eletrônico, com volume e preço mínimo de venda, e em poucos minutos BC diz qual taxa de corte foi aceita, e aqueles bancos que propuseram vender Us$ abaixo daquela taxa, vendem os volumes  de US$ apresentados ao BC.

Em alguns dias o BC paga os R$ aos Bancos e recebe os US$ no exterior, que aumentam as reservas cambiais do país. Tais dólares são então investidos em títulos emitidos por governos das principais economias do mundo, porém, na sua maioria, estes recursos ficam investidos em títulos públicos americanos que pagam de 2 a 3% a.a de juros.

Os US$ que os Bancos vendem ao BC vêm dos estrangeiros que querem investir no Brasil. Os bancos compram US$ destes investidores e os vendem ao BC.

Porém, da onde vem o dinheiro, os R$, que BC usa para comprar tais dólares?

Boa pergunta…

Para responder é preciso entender que BC é um banco, controlado pelo Tesouro Nacional, um banco que capta recursos n0 mercado. Porém  só os bancos, o próprio Tesouro Nacional e alguns fundos do governo podem depositar ou aplicar dinheiro no BC. Além disto, diferente de outros bancos, o BC pode emitir moeda, imprimir reais ou fazer depósito de reais nas contas dos bancos, desde que tenha autorização do conselho monetário. O BC cria moeda ao fazer isto.

Os recursos que BC capta através de depósitos ou de captações junto aos bancos privados ou junto ao próprio tesouro nacional são na sua maioria investidos em títulos da dívida pública em reais.

Porém, quando o BC compra US$, ele precisa captar,ou seja, tomar emprestado os recursos em R$ para poder pagar pelos US$ que comprou. Quando as operações de compra de US$ por parte do BC são liquidadas, o BC credita os R$ correspondentes nas contas dos bancos que venderam os US$, que por sua vez creditam as contas de seus clientes que lhes venderam os US$.

Aí surge o problema: se o BC simplesmente creditar os reais nas contas dos bancos, o volume de R$ em circulação aumenta, derrubando juros, aumentando consumo e inflação. Embora emitir R$ para comprar US$ seja uma forma barata de comprar US$, já que não haveria juros ou encargos a serem pagos pelo próprio BC, este mecanismo aumentaria muito o dinheiro em circulação trazendo assim inflação.

Logo, o BC  precisa evitar que tais R$ fiquem em circulação. Aí ele faz o que chamamos de esterilização dos Reais decorrentes da compra de US$ por parte do BC.  O BC então toma emprestado tais Reais que emitiu para pagar as compras de dólares junto aos próprios bancos. Tais reais são aplicados pelos bancos privados em operações compromissadas com prazo de até 180 dias. Assim o dinheiro fica parado, aplicado no BC, por até 180 dias, saindo de circulação. O BC paga em tais operações juro equivalente a taxa selic, que hoje subiu para 11.25% AA.

Bem, com esta operação o BC tem um prejuízo de cerca de 9.25 %AA, que é a diferença entre os juros que BC paga para esterilizar os R$ em operações compromissadas vs. a rentabilidade dos investimentos dos US$ no exterior. Além disto, caso a taxa de câmbio do US$ caia, BC terá um prejuízo, pois o valor das reservas cai VS o valor das obrigações em R$ do próprio BC. O tesouro precisa então pagar ao BC tal custo. Este pagamento por parte do Tesouro aumenta o déficit público.

O BC capta hoje cerca de R$ 400 bi em operações compromissadas junto ao mercado. Aplicando sobre este volume os 9.25% AA, verificamos que custa ao Tesouro aproximadamente R$ 37 bi por ano (quase três vezes o dinheiro gasto na bolsa família) para manter estas reservas cambiais e comprar US$, impedindo sua queda.

Bem, isto não é novidade…

Há outro problema neste modo operando. Dado o volume elevado de nossas reservas, podemos supor que BC não irá vendê-las em 180 dias para pagar seus compromissos assumidos nas captações de recursos junto aos bancos: enquanto houver fluxo de entrada de divisas, as reservas não vão cair, pois BC não poderá vender seus dólares no mercado pois isto derrubaria  o US$ a um nível irreal.

Logo, BC está assumindo um risco de liquidez, pois está captando dinheiro de curto prazo, até 180 dias, para financiar ativos (as reservas) que são de fato ativos de longo prazo. Se os bancos precisarem do dinheiro, de R$, para emprestar, eles não irão renovar as operações compromissadas com o BC no seu vencimento. Irão assim receber R$ do BC, que terá que emiti-los para pagar suas obrigações. Tais Bancos então vão emprestá-los, fomentando o consumo e a inflação. Logo, há limites práticos para o volume total de operações compromissadas.  O volume atual destas operações representa mais de 25% do total das operações de crédito dos Bancos. Tais bancos usam tais aplicações no BC como um colchão de liquidez, uma reserva de caixa  para honrar seus depósitos. Contudo, o volume desta reserva de caixa está subindo  rapidamente. Com mais caixa em reserva, bancos ficam mais motivados a emprestar mais ainda, e a assim ofertam mais crédito, o que acaba empurrando o consumo para cima e aumentando a inflação. Com mais crédito disponível, demanda por commodities sobe e, portanto, inflação sobe… Isto força BC a subir mais juros, que por sua vez aumentam o custo de financiamento das reservas cambiais por parte do Tesouro, como vimos acima, e atrai mais divisas para o país.

Ora, os Chineses descobriram um truque para contornar este problema: eles obrigam os Bancos a depositarem recursos no BC (os chamados depósitos compulsórios), o que impede que tais bancos emprestem tais recursos. Daqui podemos concluir que, a continuar esta acumulação de reservas por parte do BC, é muito provável que se aumente os depósitos compulsórios dos Bancos junto ao BC. Porém há limites para isto. Hoje o volume total de depósitos no BC (voluntários e compulsórios) por parte dos bancos é da ordem de R$ 270 bi… Logo, o BC teria que aumentar os compulsórios em mais de 75% para absorver 50% do volume de operações compromissadas que este toma hoje junto ao mercado!

Outra questão que surge é que tal processo de esterilização, seja voluntário, seja compulsório, aumenta o balanço do BC: ele aumenta suas captações junto aos Bancos e vai aumentando seus investimentos no exterior. Este processo cria uma expansão de moeda nos EUA! Pois aqueles americanos que vendem os títulos públicos daquele país ao BC não tem o que fazer com o US$. Eles acabam deixando o dinheiro parado na conta corrente, o que acaba derrubando a cotação deste US$ no mercado internacional por excesso de oferta e juros zero de curto prazo, o que força o nosso BC a comprar mais US$, aumentando a bolha.

Eu acredito que a próxima bolha a explodir estará relacionada com o tamanho do balanço dos BC´s dos países emergentes.

Imagine então que um dia os juros nos Estados Unidos comecem a subir. Aí o valor dos títulos de renda fixa dos EUA vão cair, o mesmo acontecendo com os papéis do tesouro americano que o BC possue. Neste momento , com juros maiores nos EUA, os investidores que hoje estão aplicando aqui irão resgatar seus investimentos no Brasil, e comprar US$ para então investirem lá fora.

Neste momento nosso BC terá que vender seus papéis lá fora com prejuízo, para gerar US$, e então vendê-los aqui aos bancos locais que irão vende-los para os investidores estrangeiros que estiverem levando seu dinheiro para fora. Até aí tudo bem pois provavelmente nesta hora o US$ vai subir e BC irá realizar um ganho cambial na venda dos US$ aos bancos locais, como aconteceu em 2009. Porém isto quer dizer que o tal do caixa de reserva de liquidez dos bancos aqui vai cair neste momento, pois volume de operações compromissadas com o BC irá cair, e com isto vai cair a oferta de crédito interno por parte dos bancos privados, que terão que reduzir suas carteiras de crédito na medida que seu colchão de liquidez cai. Logo, ao comprar reservas neste montante, os BC´s estão importando e alavancando os efeitos de uma eventual alta de juros nos EUA e importando para dentro do país ( seja China, seja Brasil) um excesso de liquidez global que é apenas parcialmente esterilizada . Este é o mecanismo de importação de bolha BORG que já mencionei aqui várias vezes.

Esta situação é insustentável. Vamos torcer para que EUA voltem a crescer, porém gradualmente, para que China pare de exportar e consuma mais, e para que economia aqui reduza seu ritmo, de tal forma que permita uma queda nas taxas de juros selic e uma elevação gradual da taxa de juros nos EUA, o que reduziria a entrada de capitais aqui,  reduzindo assim o crescimento das reservas e do balanço do BC…. precisamos esfriar nossa economia e então derrubar juro rápido para podermos impedir esta entrada de dólares...

Senão, próxima bolha será nos BRICS…