terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Como não se enganar quando o assunto é plano de previdência

Entenda como funcionam os planos de previdência privada, muito ofertados por bancos e seguradoras nesta época do ano, e evite ciladas na hora da contratação

Priscila Yazbek, de EXAME.com

Todo final de ano, as instituições financeiras aproveitam para aumentar as investidas na captação de novos clientes para os planos de previdência. O argumento é que, contratando o plano antes do final do ano, os clientes terão a vantagem de abater os recursos investidos na declaração do imposto de renda do ano seguinte. Por isso, o momento é propício para entender quais são os cuidados na hora de contratar os planos e evitar algumas armadilhas se você for o próximo cliente na mira dessas instituições.

Com os juros menores, alguns cuidados para a escolha do plano de previdência e suas modalidades se tornam ainda mais pertinentes. Como muitos dos investimentos dos fundos de previdência são ligados à renda fixa, com a taxa Selic menor, os retornos também ficam reduzidos. No atual patamar de juros de 7,25% e com uma inflação projetada em 5,34% para o fim de 2012, a taxa real hoje é de 1,91%. E assim, o plano errado pode prejudicar mais ainda os investimentos agora. 

A seguir, elencamos alguns dos principais pontos envolvidos na contratação de um plano de previdência. Leia e descubra como fugir dos principais erros que os clientes cometem ao contratar este tipo de produto.  

PGBL ou VGBL? 

Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) são as modalidades de planos de previdência que o cliente pode escolher na hora da contratação. Os PGBLs permitem que os valores destinados ao plano de previdência sejam incluídos nas despesas dedutíveis na declaração do imposto de renda, até um limite de 12% da renda tributável. Mas, quando ocorre o resgate dos recursos, o imposto de renda incide sobre todo o montante investido. No entanto, para aproveitar o benefício, o investidor deve usar a declaração completa de IR e informar as contribuições para o PGBL como parte das despesas dedutíveis.

Os VGBLs, por sua vez, possuem outra relação de tributação. Nesta modalidade, os valores investidos não são abatidos na declaração do IR. A grande vantagem é que a tributação do IR ocorre apenas sobre a rentabilidade, na hora do resgate. Essa modalidade é para quem usa o modelo simplificado da declaração, que realiza um abatimento único de 20% sobre as despesas tributáveis. Se quem usa esse tipo de declaração porventura optar por um PGBL, não só não recebe o benefício tributário como pagará IR duas vezes: a primeira no ato do investimento, pois as aplicações entrarão na sua renda tributável; e a segunda nos resgates, já na época da aposentadoria.

Neste item o cuidado, portanto, é para não escolher a modalidade errada. Principalmente porque alguns bancos, gestoras de investimentos e seguradoras acabam exaltando a possibilidade de abatimento da tributação do PGBL para atrair clientes, sem informar claramente qual é a melhor modalidade para o seu perfil. O problema é que, uma vez escolhida a modalidade, não é possível modificá-la. A menos que o investidor resgate os recursos, o que será tremendamente desvantajoso por causa da incidência de altas alíquotas de imposto de renda sobre os ganhos.

Tabela de tributação progressiva ou regressiva

Outra importante decisão é sobre as formas de tributação. Pela tabela progressiva, as alíquotas do imposto de renda aumentam de acordo com o montante investido. E na tabela regressiva, as alíquotas diminuem em função do tempo. Veja nas tabelas a seguir, considerando que a tabela progressiva está nas versões anual e mensal para o ano-calendário de 2012:

Tabela progressiva

 Base de cálculo mensal (R$)  Alíquota
 Até 1.566,61  Isento
 De 1.566,62 até 2.347,85 7,50%
 De 2.347,86 até 3.130,51 15,00%
 De 3.130,52 até 3.911,63 22,50%
 Acima de 3.911,64 27,50%

Tabela regressiva

Prazo de acumulação Alíquota
Até 2 anos 35%
2 a 4 anos 30%
4 a 6 anos 25%
6 a 8 anos 20%
8 a 10 anos 15%
Acima de 10 anos 10%

Para saber qual regime é melhor para cada investidor, é preciso estimar qual será o prazo do investimento e a quantia investida. A tabela regressiva é mais vantajosa para quem pretende permanecer no fundo por mais de dez anos e reunir um alto volume de patrimônio (o que dependerá de sua capacidade de poupança, se considerada uma simulação mais conservadora).

Já a tabela progressiva deve ser escolhida quando a perspectiva de acumulação de patrimônio for baixa, uma vez que para volumes menores a alíquota incidente pode ser inferior àquela do regime regressivo em prazos superiores a dez anos. Se a capacidade de poupança não for muito alta - e com o atual patamar de juro de real de 2% ao ano - não é nada impossível que o valor de benefício mensal se encaixe na faixa de isenção ou de 7,5%. Repare que, hoje em dia, um benefício de 2.000 reais seria tributado em apenas 7,5% na tabela progressiva, que é corrigida para cima ano a ano.

Em se tratando dos planos fechados, a tabela progressiva também é recomendada quando o cotista não tiver expectativa de permanecer por muito tempo na empresa e desejar resgatar todo o montante ao se demitir. Estes planos, também chamados de fundos de pensão, são os planos oferecidos por empresas como benefício para seus funcionários. 

Se o patrimônio aumentar acima do esperado, o investidor tem a opção de fazer a portabilidade de recursos para outro plano de previdência semelhante, optando pela tabela regressiva. Mas, feita a transferência para a tabela regressiva, não se pode voltar atrás.

Escolher com cuidado a forma de tributação é muito importante para que o investidor não perca dinheiro. "Se o investidor faz a opção pela tabela regressiva significa que ele não deverá resgatar o recurso antes de quatro anos. Se ele resgatar antes, ele terá uma tributação muito alta e poderá ter trocado o nível máximo de tributação do regime progressivo, de 27,5% pelos 30% ou 35% do regime regressivo", explica Fernando Meibak, sócio da consultoria Moneyplan e autor do livro "O Futuro Irá Chegar! Você Está Preparado Financeiramente para Viver até os 90 ou 100 Anos?".

Em outras palavras, mesmo a pior alíquota do regime progressivo será melhor do que a tributação do regime progressivo se o prazo for inferior a quatro anos. 

Custos do plano

Os custos do plano de previdência devem ser o principal critério de escolha da instituição financeira. Com a taxa Selic a 7,25% e a tendência de manutenção dos juros em níveis não muito diferentes dos atuais, os custos dos planos pesam ainda mais no bolso dos investidores. 

Meibak recomenda que não se invista em planos com taxas de administração acima de 1,25% ao ano e que possuam taxa de carregamento. "Fazendo um cálculo complexo e considerando o patamar de juros baixos, os benefícios fiscais e algumas outras variáveis, conclui-se que um plano com uma taxa superior a 1,25% ao ano já não vale a pena", afirma. 

Segundo ele, não é difícil encontrar planos isentos de taxa de carregamento. Esta taxa, quando cobrada, determina que o cliente pague uma certa porcentagem sobre o valor investido a cada aporte. 

Os custos dos planos de previdência muitas vezes são os fatores que tornam este investimento desvantajoso em relação a outros. Alguns planos chegam a cobrar taxas de administração superiores a 3% e ainda taxas de carregamento que chegam a 5%. Custos proibitivos para um tipo de investimento que não pode ter uma estratégia extremamente arriscada e portanto não tem grandes chances de trazer altos retornos. 

Um estudo da consultoria NetQuant, inclusive, mostrou que a taxa de administração média dos fundos de previdência de varejo que investem apenas em renda fixa é de 2,85% ao ano. Essa taxa é mais alta do que a média praticada entre os fundos de renda fixa comuns, que, no varejo, é 2,39% ao ano, segundo a NetQuant.

Estratégia do fundo 

Os fundos de previdência possuem diferentes estratégias de investimento. Existem fundos que investem apenas em títulos públicos, em renda fixa pública e privada e os que admitem renda variável (ações, câmbio, juros etc.). Entre estes, há os que aplicam até 15% do patrimônio em renda variável, de 15% a 30%, acima de 30%, os multimercados e os fundos de ações – que aplicam ao menos 67% do patrimônio em renda variável. 

Os fundos de pensão já possuem outra regra. Eles podem aplicar até 70% em renda variável (somente para ações de empresas listadas no Novo Mercado da BM&FBovespa), até 20% em títulos de crédito privado, até 8% em imóveis, até 15% em empréstimos e financiamentos a participantes e assistidos, até 10% de investimentos no exterior e até 20% em investimentos estruturados, onde se incluem os fundos imobiliários e os multimercados.

O cuidado neste ponto é para não escolher um fundo muito conservador para o seu perfil. Quando mais jovem for o cliente, mais arriscado pode ser seu plano, uma vez que ele terá mais tempo de contribuição. Assim, há um prazo maior para que o fundo recupere eventuais prejuízos ocorridos pela opção por uma estratégia mais arriscada. Algumas instituições oferecem planos progressivos, em que a parcela de renda variável vai reduzindo à medida que o investidor envelhece.

Fernando Meibak indica quais seriam as estratégias mais indicadas por idade. "Eu tenho uma visão de que as pessoas, não importando a idade, devem contratar um plano misto, que investe em renda fixa e variável. Entre 20 a 30 anos de idade, seriam planos que investem de 30% a 40% em renda variável, entre 30 a 40 anos, planos com 20% a 30% em renda variável, de 40 a 50 anos, de 10% a 20% e de 50 anos em diante, quando já não se pode ter muitos riscos, menos de 10% do plano deve ser voltado à renda variável", diz. 

Simulações irreais 

Algumas instituições, ao apresentar os planos, fazem simulações de rentabilidade que podem ser bem distantes da realidade. Meibak afirma que tem sido muito comum seguradoras, bancos e gestoras simularem condições de investimento mais negativas que o normal para mostrar ao cliente que sua rentabilidade não será tão alta. Assim, elas os pressionam a aumentar o volume dos aportes. 

Segundo ele, normalmente este tipo de truque aparece entre planos de "renda contratada" ou "renda definida", que são aqueles que já possuem o benefício futuro definido no momento da contratação. "As instituições fazem estimativas de rentabilidade ultraconservadoras, imaginando que os juros básicos da economia vão cair a 2%, 0% e pressupõem que o cliente viverá até os 100 anos. Assim, elas consideram uma rentabilidade abaixo do normal para forçar o cliente a investir uma contribuição mensal muito maior do que ele precisaria", explica. 

Com maiores contribuições, naturalmente, as empresas acabam lucrando mais. Por isso, a orientação é tomar cuidado com simulações que contemplam um cenário muito pessimista para o investimento.

Por outro lado, também existem instituições que forçam as rentabilidades para cima. Elas projetam rentabilidades muito acima das possibilidades reais, para atrair mais clientes. Para se ter um parâmetro, é importante que a rentabilidade não esteja muito distante dos juros reais da economia, hoje próximos a 2%, que seriam os juros da taxa Selic, descontando-se a inflação.  Sobretudo se o investimento for mais concentrado em renda fixa, pois neste caso a rentabilidade dos investimentos costuma ser ainda mais próxima do juros reais.

Trabalhar com uma taxa de 2% ao ano pode soar conservador, mas isso se justifica porque como os investimentos são feitos no longo prazo, como 20 ou 30 anos, os planos de previdência são bastante imprevisíveis. É impossível estimar o que vai acontecer com a economia nos próximos 30 anos ou mais.

Herdeiros

A designação dos beneficiários também é um ponto de alta relevância na contratação do plano de previdência. Mas, apesar disso, este é um dos tópicos mais negligenciados pelos investidores, segundo o sócio da consultoria Moneyplan Fernando Meibak. "Tem gente que não indica os beneficiários. Com isso, os herdeiros acabam recebendo os valores via espólio e os recursos sofrem maior tributação". Indicando os beneficiários, o montante acumulado no fundo é recebido sem necessidade de inventário. 

Se o contratante não tiver indicado qualquer beneficiário, então os herdeiros legais receberão o montante aplicado, segundo o artigo 792 do Código Civil. Meibak orienta que os beneficiários sejam indicados de acordo com o que está estabelecido por estas regras contidas na legislação que rege o direito sucessório. "Pelas regras legais, o cônjuge ficaria com 50% e os filhos repartiriam o montante restante. Se o cliente indicar no plano que um único filho deve receber 100% dos recursos, os familiares que se sentirem prejudicados podem contestar a divisão na justiça", afirma. Em caso de a decisão ser levada à Justiça, os recursos ficarão retidos e seguirão para inventário.

É importante também ressaltar que ao entrar no plano de previdência, o investidor deve contratar um plano adicional de "renda reversível" ou de "prazo mínimo garantido". Caso isto não ocorra, se o contratante vier a falecer após a sua aposentadoria, o saldo das reservas ficará para a instituição financeira.