sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Telecom - Cenário competitivo vive dilema do 'copo meio cheio ou meio vazio'

Por Ivone Santana | De São Paulo
Valor.com

Os movimentos de fusão envolvendo grandes operadoras na Europa e no Brasil, na semana passada, reacenderam a discussão sobre o número adequado de competidores no país. Mais uma vez, o mapa das operadoras caminha para uma redução, em um mercado cujos consumidores reclamam há muito tempo reclama de preços considerados elevados e qualidade de serviços insatisfatória.
Para as operadoras, há excesso de competição; para o governo, nem tanto; para representantes de consumidores, há espaço para mais atores. É a história do copo que parece meio cheio ou meio vazio, dependendo de quem o observa. Para as teles, já está mais que meio cheio, o que estaria afetando a rentabilidade.

A competição está em constante transformação. O Brasil chegou a ter 927 operadoras privadas de telecomunicações antes de o governo estatizar o setor, em 1972, e estabelecer o Sistema Nacional de Telecomunicações. Com a mudança, o número de empresas foi reduzido a uma por Estado, sob o guarda-chuva da estatal que passou a ser conhecida por Sistema Telebras. Esse conjunto de operadoras públicas chegou a ter 98 mil funcionários para uma base de 15,9 milhões de clientes e receita de US$ 12,7 bilhões. Quando foi privatizado, em junho de 1998, o Sistema Telebras contava com 18 milhões de telefones fixos instalados e 4,6 milhões de celulares em menos de 23 mil localidades.
O cenário de asfixia mudou drasticamente após a privatização. Grandes grupos econômicos internacionais se enfrentaram por fatias promissoras do território brasileiro, dividido em três regiões para telefonia fixa e dez para celular, além da longa distância com licença para atuar em todo o país. As brigas nunca cessaram.

O cenário da competição foi refeito várias vezes ao longo dos últimos 15 anos, com investidores americanos, espanhóis, italianos, mexicanos e outros se revezando no ringue.

Novas mudanças foram anunciadas na semana passada e os desdobramentos são esperados até o ano que vem. Está em xeque o futuro da TIM, que poderá ser selado a partir do dia 17 de novembro, quando sua controladora, a Telecom Italia, pretende decidir se venderá ou não esse ativo. Aqui cabe uma explicação. A espanhola Telefónica pode exercer, em janeiro, uma opção para assumir o controle da Telecom Italia. Isso implicaria uma concentração de licenças no Brasil, onde a Telefónica controla a Vivo. Na prática, uma única empresa teria duas operadoras no país - TIM e Vivo -, algo que os órgãos reguladores prometem barrar.

Se a TIM for colocada à venda e comprada por um novo competidor, o país continuará com quatro grandes operadoras - Vivo, Claro e a nova Oi, além da TIM. Mas, se a TIM for fragmentada e vendida aos concorrentes, uma operadora sumirá do mapa, enquanto as outras três sairão fortalecidas.

Mesmo a fusão da Oi com a Portugal Telecom não altera o modelo competitivo no país imediatamente. Ambas já eram sócias e o avanço do grupo português na participação de capital e no controle da operadora brasileira já era esperado.
O desenho atual é resultado de um modelo competitivo que não conseguiu avançar. Um mercado com quatro operadoras de serviços móveis é menos do que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) tinha planejado. A Anatel criou todas as condições para que a Nextel se tornasse a quinta grande operadora. A banda H, por exemplo, só iria para outras teles se a Nextel não quisesse adquirir o bloco de frequência em leilão. A Nextel fez o lance, mas, soterrada por dificuldades financeiras e estratégias erráticas, encolheu.

É fácil ver por que os órgãos reguladores e de defesa concorrencial dizem que não aceitarão a fusão de Vivo e TIM. Juntas, as duas teles detêm 55,9% de participação de mercado. Do total de 268,4 milhões de linhas celulares registrados em agosto no país, elas somam quase 149 milhões de conexões.
Por isso, a venda da TIM, mesmo fragmentada, é considerada "menos danosa" que sua fusão com a Vivo, disse ao Valor uma pessoa ligada ao Ministério das Comunicações.

O raciocínio do governo, segundo essa pessoa, é que das quatro operadoras atuais, só três competem realmente entre si: Vivo, TIM e Claro. Menor de todas, a Oi tem quase 50 milhões de conexões móveis. Enquanto a rede de terceira geração da Vivo cobre mais de 3,1 mil localidades, a da Oi chega a 865 municípios. A TIM também não está bem-posicionada, com 899 localidades cobertas, e a Claro, com 1,48 mil.

Em tese, a nova Oi, batizada provisoriamente de Corpco, ganha musculatura para crescer. Mas sua dívida líquida somada à da Portugal Telecom chegou a R$ 45,6 bilhões em junho, para um lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de R$ 12,5 bilhões nos 12 meses encerrados em junho. Isso é um complicador. Ainda assim, o governo tem a expectativa de que a empresa consiga negociar suas dívidas e direcione os investimentos para ganhar vantagem competitiva.

As apostas do governo no novo cenário são altas. Afinal, já houve muitas tentativas e erros. No celular, a competição começou com as bandas A e B de telefonia. De um lado estavam as empresas que ficaram com as redes legadas do Sistema Telebras (banda A); de outro, as que vieram para competir.
A Anatel e o governo tentaram fomentar a concorrência com a criação de "espelhinhos" - pequenas operadoras com a missão de estabelecer a competição local, por cidade. Foram vendidas dezenas de licenças em todo o país. Mas o modelo se mostrou um fracasso. Os donos das licenças não conseguiram financiamento para implantar suas redes, geralmente por falta de garantias. Desanimados, devolveram as licenças e desistiram do negócio, com poucos sobreviventes.

Mais recentemente a Anatel tentou atrair investidores para as operadoras móveis de rede virtual (MVNO). As empresas podem lançar o serviço alugando a infraestrutura de outras teles. A expectativa era de mais de uma centena de interessados. Foi outro fiasco, ao menos até agora. Apenas a Datora, em associação com Porto Seguro, ativou o serviço e ocupa 0,03% de participação de mercado, para oferecer comunicação entre máquinas (M2M).
Na telefonia fixa, a formatação de empresas-espelho para concorrer com Telefônica, Oi e Brasil Telecom também não vingou. A Vésper, espelho da Telemar (Oi) e Telefônica, acabou sendo comprada pela Embratel. O único caso que sobreviveu e virou uma empresa cobiçada foi a GVT, criada para concorrer com a Brasil Telecom, a qual foi adquirida pela Oi.
A espelho da Embratel na longa distância era a Intelig, que também passou por várias mãos até ficar com a TIM. Hoje, todas as operadoras podem oferecer o serviço.

O megaempresário mexicano Carlos Slim Helú tirou proveito das oportunidades que apareceram. Por meio da América Móvil, é dono da Embratel, Claro e Net.
E a internet, que chegou ao país devagarinho, capenga e por muito tempo com acesso discado, com o tempo se entrelaçou de tal maneira nos serviços das operadoras que virou parte vital da telefonia fixa e móvel, e começa a se expandir também por satélite.

O mapa das telecomunicações mudou - encolheu no número de empresas, mas cresceu no de usuários; hoje, abriga quase 45 milhões de linhas fixas e mais de 114,7 milhões de acesso em banda larga fixa e móvel.