segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Como as nações voltam do inferno

 "Quem são os líderes?" "Quais elites atenderão ao chamado?" "Quem tem um plano?"
 
Por Marcos Troyjo


O diagnóstico mais elementar que se oferece a situações de múltiplas crises (econômica, política, moral) enfrentadas por nações em diferentes contextos históricos vale-se, na maioria das vezes, de um familiar – e correto – senso comum.
 
Com o Brasil atual não é diferente. Evitar o inferno viria de menos "politicagem" e mais "política" – bem como mais honestidade, trabalho, investimento e competitividade.
 
Teríamos de aprimorar a "classe política", pois esta é, salvo exceções, corrupta e disfuncional.
 
Haveria de aumentar o grau de honestidade da relação público-privado, pois assim inviabilizaríamos, na fonte, toda uma série de falcatruas.
 
Caberia ao brasileiro trabalhar melhor, pois norte-americanos e alemães apresentam produtividade quatro vezes maior.
 
Seria função do empresariado investir mais, pois não apenas nossa taxa de investimento como percentual do PIB é das mais baixas entre países emergentes, mas também a predisposição dos empreendedores brasileiros em correr mais risco na atual conjuntura encontra-se muito fragilizada.
 
Cumpriria ao governo mais acordos no campo do comércio e de cooperação industrial e tecnológica, pois só assim ofereceríamos novos mercados e parceiros a nossas empresas, garantindo-lhes competitividade e, portanto, longevidade.    
 
De fato, se a política fosse menos corrompida, as relações estado-sociedade civil mais transparentes, o povo mais trabalhador, o empresário menos acomodado e o governo menos protecionista, estaríamos mais distantes dessa armadilha infernal de apatia econômica, anomia política e espanto moral que hoje nos consome.
 
Ninguém aqui ousa negar a importância de políticos probos, atores públicos e privados parametrizados por instituições, prevalência da ética do trabalho, predileção por uma presença internacional mais competitiva das empresas brasileiras.   
 
Todas essas características, no entanto, não se instalam nas nações de forma laboratorialmente sincrônica e uniforme. Muitos países tidos como competitivos ou mesmo desenvolvidos apresentam flancos vulneráveis em todos esses quesitos.
 
A Itália tradicionalmente contrasta inoperante esfera governamental com imponente classe empresarial, seja nas firmas de menor porte ou nas gigantes multinacionais italianas.    
 
As relações governo-empresas na China está longe de ser parametrizada por noções como "compliance", "melhores práticas", "relações com investidores". As recentes intervenções das autoridades centrais no contexto das oscilações da Bolsa de Xangai é apenas um de muitos exemplos de falta de transparência.   
 
A geração de alemães hoje na faixa dos 70 anos reclama que seus compatriotas mais jovens só querem saber de turnos de serviço de 36 horas por semana. Assim, o país nivelaria por baixo sua força de trabalho com a atração de mão-de-obra mais barata e menos qualificada do leste europeu.  
 
Na Coreia do Sul e no Japão, é grande o temor de que os mega-conglomerados multisetoriais anestesiaram seu apetite por risco e inovação e movimentam-se apenas pela manutenção de seu atual "market share" global.
 
Apesar de todo apelo conceitual à livre concorrência e a acordos de liberalização comercial, em todos os países que compõem a União Europeia se praticam abusos protecionistas, particularmente no âmbito da PAC, a Política Agrícola Comum.
 
Nessa linha, fica claro que para a saída da presente crise brasileira é impossível copiar imaginários modelos ideais. Ainda assim, tendo experimentado o inferno, muitas nações conseguiram, chamuscadas, voltar dele por que obtiveram vitórias pontuais, mas concretas –e daí ingressaram num gradual aprimoramento.
 
Em todos os casos de superação, no entanto, convergiram, como precondições, alguns fatores essenciais: liderança, equipe e estratégia.
 
Assim foi nos milagres econômicos asiáticos como os presididos por Lee Kuan Yew em Cingapura e Park Chung-Hee  na Coreia dos Sul. Tal convergência também se manifestou na Espanha dos Pactos de Moncloa ou no Reino Unido de Thatcher.
 
Para tais vitórias, foi fundamental que lideranças públicas se associassem a elites funcionais municiadas de um mapa do caminho. Daí, a gravidade da conjuntura brasileira.
 
As nações voltam do inferno quando respondem satisfatoriamente a três questões: "quem são os líderes?" "Quais elites atenderão ao chamado do destino?" "Quem tem um bom plano?"