terça-feira, 30 de novembro de 2010

Algumas nuvens no horizonte da economia brasileira

Ricardo Denadai
30/11/2010

Apesar da crise, os últimos anos foram, predominante- mente, de ventos a favor para a economia brasileira. Mas estão surgindo algumas nuvens no horizonte.

As perspectivas para o país são favoráveis, mas entraremos em uma fase mais difícil para a condução de política macroeconômica, o que irá requerer habilidade extra do novo time econômico. Será desafiador administrar uma economia que cresce a taxas elevadas, com sinais claros de aceleração inflacionária e que pretende evitar que sua moeda se aprecie ainda mais.

Não há atalho, nem solução mágica. O que tem de ser feito é desacelerar a demanda através de um esforço fiscal significativo e, ao mesmo tempo, adotar medidas que contribuam para o aumento da produtividade. Mas, por enquanto, não há sinalizações de que será esta a direção a ser tomada.

São cinco diagnósticos principais. O primeiro é o de que a segunda rodada do afrouxamento monetário quantitativo pelo Fed continuará enfraquecendo o dólar, mas pressionará os preços das commodities. E vale ressaltar que a valorização das commodities em dólar tem sido superior a apreciação do real, de modo que os preços das commodities estão subindo em reais.

Essa alta das commodities tem pressionado nossa inflação doméstica de modo significativo, e as perspectivas para os próximos meses são de continuidade desse movimento. Ademais, é provável que a surpresa inflacionária que vivenciaremos nos próximos meses eleve ainda mais a expectativa de inflação para o próximo ano, que já se encontra acima do centro da meta, de 4,5%.

O segundo diagnóstico é o de que a apreciação do real foi declarada como "inimigo público número 1". Basta repararmos no teor das declarações recentes do governo, que cunhou, inclusive, o termo "guerra cambial". Hoje, a preocupação central está no câmbio e não no controle da inflação, na eficiência fiscal ou no aumento da produtividade.

O terceiro é que a economia está aquecida. A absorção doméstica, que é a soma do consumo das famílias, investimentos e gastos do governo, está crescendo (e continuará crescendo) a um ritmo muito forte. O mercado de trabalho vem batendo recordes sucessivos de geração de emprego e de redução da taxa de desemprego. O crescimento acumulado de junho a setembro do rendimento médio real da população ocupada foi de 6%, algo impressionante. O crescimento do salário real é o sintoma mais claro de um mercado de trabalho apertado.

A combinação de emprego e renda crescendo, com crédito abundante e confiança elevada continuará estimulando o consumo das famílias e sustentará um ritmo de crescimento expressivo da demanda doméstica.

O quarto diagnóstico é que não parece ser predominante a probabilidade de haver um esforço fiscal significativo para desacelerar a demanda. Embora não haja nada definitivo nesse sentido, o prenúncio não é exatamente o que podemos chamar de animador. Um esforço fiscal significativo seria o cumprimento da meta de superávit primário de 3,3% no ano que vem (que agora será menor com a saída da Eletrobras do cálculo), sem manobras contábeis e que requeira contenção das despesas correntes. Também é necessário fazer cumprir a regra do salário mínimo para 2011 e que haja, de fato, alguma redução da expansão do crédito pelos bancos federais.

Quinto e último diagnóstico. Em razão da questão cambial, é elevada a chance de que o BC postergue a elevação da Selic, com receio de aumentar ainda mais o diferencial de juros e, consequentemente, atrair mais recursos estrangeiros. Retardar a elevação da Selic, mesmo que sejam adotadas medidas paliativas, como compulsório e/ou IOF sobre crédito, aumentará o risco de intensificação da deterioração das expectativas de inflação.

Em resumo, o cenário macroeconômico para o Brasil ainda segue favorável, mas está bem mais complicado. É premente a necessidade de desacelerar a demanda e, neste momento, a contenção dos gastos do governo é a opção mais eficiente, de modo a conter a inflação e evitar o agravamento da questão cambial.

Mas como é baixa a probabilidade de haver uma política fiscal suficientemente contracionista, a economia seguirá aquecida, a inflação vai subir e, cedo ou tarde, o Banco Central terá de subir juro para conter a deterioração da inflação.

Ricardo Denadai é economista do Santander Asset Management