quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Metamorfose da economia chinesa

Marcos Troyjo
Professor do IBMEC e pesquisador da Universidade Paris V- Sorbonne


A segunda maior economia do mundo já iniciou a mudança de seu DNA. O modelo econômico chinês, implementado por Deng Xiaoping desde 1978, se dissipará progressivamente ao longo dos próximos anos. A China deixará de ser uma "nação-comerciante" (baseada em exportações) para tornar-se uma "nação-rede" (intensiva em tecnologia).
 
Tal modelo era essencialmente sustentado pelo acesso desimpedido aos principais mercados compradores do mundo. Pelos baixos custos dos fatores de produção (sobretudo mão-de-obra) e de insumos como água, eletricidade e terra. Por uma presença comercial internacional que fazia de cada embaixada ou consulado chinês verdadeiras máquinas de inteligência comercial e realização de negócios.
 
Este modelo experimenta uma transmutação estrutural que se deve a uma variedade de fatores.
 
A China sabe que não tem mais como sustentar a absorção de mão-de-obra pouco qualificada em setores de baixo valor agregado apenas com a atração de investimentos estrangeiros diretos em busca da redução de custos de produção. A própria evolução da indústria manufatureira demanda elemento humano mais preparado, e portanto mais caro.
 
A China também está levando a cabo sua diáspora corporativa transferindo atividades de produção para praças mais baratas em seu entorno asiático, como o Vietnã ou mesmo a Índia, e também para a África. Além disso, dado o enfraquecimento do dólar e do euro, algumas atividades anteriormente realizadas na China estão se realocando para Europa e EUA, mais próximas assim de seus mercados-destino.
 
A trajetória do investimento chinês em pesquisa, desenvolvimento e inovação não pára de crescer. Saltou de 0,8% do PIB em 2002 para 1,4% em 2011. Como resultado, já é patente o pioneirismo chinês em algumas áreas de ponta como energia solar. Vale exemplificar com a aquisição, por parte do legendário Warren Buffet, de US$300 milhões em ações da empresa BYD (Build Your Dreams), de Shenzhen, que projeta e fabrica automóveis elétricos, além de outros componentes de alta tecnologia voltados a satélites, tablets e telas de alta definição.
 
Fora isso, o período da historia econômica global que ora se inicia com os ajustes na Europa e EUA decorrentes das mirabolâncias financeiras deverá ser de maior protecionismo comercial. Este novo quadro é desafiador para a China, país que mais se beneficiou com a globalizacão dos últimos 25 anos.
 
A China terá de divisar novas formas de atração de investimento produtivo, que provavelmente trarão em seu bojo alguma modalidade de compras governamentais como atrativo para que, por meio de fórmulas de substituição de importações, empresas estangeiras venham a se estabelecer na China para abocanharem fatias do mercado interno chinês.
 
Por fim, a mudanca de DNA da economia chinesa também é resultante de seu próprio sucesso – e do aumento de responsabilidades internacionais que decorrem da pujança de seu PIB, suas taxas de poupança e investimento interno e suas reservas cambiais

Será muito difícil para Pequim nos próximos anos continuar a esquivar-se de assumir "parte da conta" advinda da correção de desequilíbrios da arquitetura financeira global.